Julia Debasse é uma amante dedicada da fauna e da flora tropicais. Observadora de pássaros e plantas, estudiosa da floresta amazônica, em sua pintura Julia inventa um habitat onde animais de diferentes épocas, espécies e regiões coexistem. Neste mapa fabulado, bichos e plantas convivem em suas naturezas tão familiares quanto prodigiosas.
No início do período de confinamento, a carioca Julia Debasse estava em Fortaleza, onde vive. Sem as tantas viagens como antes, quando explorava parques e florestas pelo país, Julia trilhou novos caminhos e começou a experimentar abordagens diferentes. No ART WALL, a artista apresenta pela primeira vez uma obra em que conjuga pintura e música, uma relação que para ela vem de longa data.
Observada pelo pai compositor, ainda criança Julia começou a cantar. Mais tarde passou a compor e a se apresentar em palcos do Rio. Depois foi tomada pelas aulas de pintura na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Julia enxerga uma relação entre as notas musicais e as cores, pensando cada obra sua como uma composição. Recentemente, após gravar músicas ao lado de seu marido Rian Batista, membro da banda Cidadão Instigado, produtor musical e, por muitos anos, músico da banda de Otto, Julia propôs a ele uma parceria. Selva Papelão (Amazônia) é a primeira colaboração dos dois nas artes visuais.
O processo de Julia envolve muita pesquisa. Leituras de textos sobre plantas e animais, livros de paleontologia, e a investigação da iconografia da fauna e da flora tropicais. Sua obra propõe a floresta como multidão. Na Amazônia, diferente de outras paisagens e vegetações, não há duas plantas iguais, ela costuma dizer. Fascinada pela proliferação de diversidade da natureza, Julia propõe um novo lugar de aproximações entre os diferentes.
O confinamento rigoroso levou Julia a permanecer dentro de casa com a família. Aproveitou o que havia disponível e começou a pintar, com seu filho mais novo, em papelão. O material traz à sua obra algo de sujo, algo da terra e dos bichos. Se molhado, por exemplo, o papelão enruga e se assemelha à textura de pelos, escamas, peles de animais. Assim, Julia realiza uma transformação do suporte modesto e corriqueiro para a materialização de um universo rico, singular. O sentido da coexistência se dá tanto pela cena total que enxergamos no trabalho finalizado quanto em seu processo, quando desde as primeiras etapas o ordinário e o incomum convivem.
A beleza fácil não interessa a Julia. As cenas planas e o uso de uma paleta saturada aliadas à combinação da fauna e da flora de tempos e lugares distintos afastam sua pintura da reprodução do real. Julia promove um encontro entre ciência, geografia, história e arte. São imagens que atuam como um feitiço com seus efeitos instantâneos e duradouros.