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ORÁCULOS

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Christiane Laclau

Fundadora da Artmotiv

Oráculos apresenta a obra recente de Marina Caverzan, na qual são cruzados diferentes sistemas oraculares, como o tarô, a cabala, a geomancia, o I Ching e a quiromancia. Eles envolvem uma série de padrões matemáticos que fundam procedimentos para alcançar determinada verdade, se realizados adequadamente durante um transe ou uma investigação. Essa matemática do invisível soma-se ao conjunto da produção da artista que tem o construtivismo como referência e alia, de forma original, rigor formal e emanação espiritual.

Em Geomantic Body (2023), 16 símbolos da geomancia se tornam 16 pinturas. Montada em círculo, a simetria e as dimensões apontam o tarô. A racionalidade enigmática, os hexagramas do I Ching. Caverzan constrói uma espécie de sincretismo oracular, buscando convergências entre sistemas oculares e desconstruindo seus símbolos, mas sem questionar suas eficácias. Dessa conjugação entre a precisão e o mistério, a obra de Marina nos convida a penetrar no desconhecido. O resultado é uma paisagem mental inédita, que parece ter sido sempre possível e ficava perdida entre o distanciamento das simbologias.

A nova temática demonstra o interesse sólido de Marina Caverzan pelo visível e o invisível, campo em que as relações entre matemática e espírito são prolíficas. Diante da multiplicidade de significados, é notável a capacidade de síntese da artista. No vídeo Mal me quer, mal me quer (2023), ela segura o caule de uma planta com espinhos. O gesto mínimo constrói triângulos no lugar dos espinhos. Quando eles são arrancados, vemos a linha. Parece uma experimentação anterior ao ato da pintura, como se Marina testasse a alteração da forma a partir da separação de seus elementos.

Em uma espécie de geometria transcendental, a artista configura um desvio no pensamento construtivo historicamente masculino. Em Papisa (2023), há uma subversão da Cabala, tradicionalmente transmitida por homens – Moisés, Abrãao, Ezequiel. Marina destaca do tarô a carta feminina que representa a sabedoria. Na instalação Pítia (2023), os instrumentos de aconselhamento e previsão da Suprema Sacerdotisa de Delfos – cidade célebre de Apolo – são contornados por mãos femininas, algumas com linhas nas palmas, indicando a quiromancia e a quirologia.

Em boa parte das pinturas, há uma combinação de triângulos e círculos. Por vezes, estão próximos ou se tocam, como em Madame Blavatsky (2022). Em outras, estão distantes, como em Mercúrio (2023). Já na obra Séance (2023), estão integrados. Nesta, um círculo é formado por vários pequenos triângulos. Com um olhar atento, encontramos uma abertura em um ponto do círculo. Ou seja, ele não é um totalmente fechado. Trata-se de um contraste entre formas regulares e simétricas, que terminam por compor um conjunto poroso. O título da obra faz referência a sessões de espiritismo, nas quais um grupo de pessoas estimula espíritos a se manifestarem por meio de objetos ou do corpo de um dos vivos, entrando em seu círculo.  

Percebemos como a artista trabalha o tema do visível e do invisível associado a perguntas sobre vivos e mortos. Ainda em Séance (2023), alguns triângulos parecem ocultos, pois são do mesmo preto do fundo da pintura, mas estão em relevo. Se escondem pela cor e aparecem pela textura. Talvez Marina Caverzan tenha como uma orientação para a produção dessas obras uma experimentação de intercâmbios entre aquilo que parece morto e que pode estar vivo e aquilo que parece vivo, mas está morto. As fronteiras que separam uma coisa da outra são borradas, o que provoca um questionamento a percepções estanques. 

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Em Psychographie (2023), há linhas de um texto descontrolado e, abaixo da tela, repousa uma pedra. Aqui, a artista dialoga com as preocupações atuais em relação ao futuro do planeta e à proteção da natureza. A obra parece indicar que a pedra está morta e que ela é também um ser convocado em uma sessão espírita. Como escutá-la? Que médium poderá nos trazer a mensagem da pedra morta? Entre tantas outras questões que a obra mobiliza, a artista imagina futuros e aponta para possíveis novas formas de mediunidade, incluindo a natureza como um ser que também devemos convocar para a mesa.

Em seu sincretismo oracular, Marina Caverzan alcança um pensamento geométrico expandido, cruzando símbolos para criar imagens estranhas e familiares. Como diz o ditado em latim que a artista encontrou no início de seus estudos sobre oráculos: “Nostis Omnia Perdet Omnia”. Ou seja, saber tudo é perder tudo.

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